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Projeto do MPMS reeduca homens para diminuir reincidência de violência às mulheres

Elevados índices de criminalidade envolvendo violência doméstica e familiar contra mulheres são uma realidade disseminada por todo o país e de presença insistente no noticiário sul-mato-grossense, desde casos de agressão, cárcere privado, até feminicídios cruéis, a consequência mais gravosa de um ciclo que tem etapas bem definidas pela experiência de quem trabalha na área. Na prática, verifica-se que um dos contornos desse tipo de delito é a própria cultura estruturada em nossa sociedade, a qual faz com que homens vejam as vítimas como sua propriedade, quase como uma coisa inanimada.

Transformar esse raciocínio em busca de um ambiente seguro para elas é o motor do “Projeto Paralelas, Traçando Novos Caminhos”, estratégia do Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS) para uma atuação preventiva e repressiva, diversa da mera pena corporal. O trabalho é para evitar a prática de crimes desta natureza e a reincidência dos autores de agressões de qualquer matiz.

“O Projeto Paralelas desenvolve um grupo de reflexão com réus e condenados por crimes envolvendo violência doméstica e familiar, buscando conscientizá-los sobre a igualdade entre os gêneros, desconstruindo o preconceito social e alterando a sua concepção sobre o respeito ao sexo feminino”, pontua o promotor de Justiça João Augusto Arfelli Panucci, lotado em Porto Murtinho.

O município é o mais recente na implantação do Projeto Paralelas. Fronteiriça ao Paraguai e no trajeto da Rota Bioceânica- novo caminho para Oceano Pacífico com previsão de mudar a economia da região – a cidade vai receber gente e consequentemente impactos sociais.

Para a municipalidade onde a iniciativa teve seu nascedouro, Chapadão do Sul, o Pararelas é ação concreta desde 2016. De lá para cá, recebeu reconhecimento pelo investimento na mudança comportamental de agressores. Um exemplo disso foi a concessão à prefeitura, parceira da ação, do selo “Prefeitura Amiga da Mulher”, no ano de 2022.

Um novo pensamento

O Projeto Paralelas propõe-se a quebrar o ciclo de violência doméstica, por meio de reeducação de homens já enquadrados na Lei Maria da Penha e correlatas. Isso ocorre mediante a obrigação de participação em grupos reflexivos, tanto para quem está sob medida de proteção quanto em execução de pena.

As reuniões são conduzidas por equipe multidisciplinar especializada, composta por psicólogos e assistentes sociais capacitados.

Como funciona

A assistente social Diva Maria de Souza explicou que o primeiro passo é uma entrevista com os encaminhados pela Justiça. É uma fase crucial do projeto, onde os participantes são informados sobre o curso e a importância de sua participação.

“Muitos homens chegam sem entender o que é violência doméstica, acreditando que se trata apenas de agressão física”, comenta. Durante a entrevista, são explicados o conceito de violência doméstica e a importância do respeito ao sexo feminino, preparando os participantes para as sessões com a equipe multidisciplinar.

“É muito gratificante, porque eles têm a oportunidade de serem ouvidos, porque com a medida protetiva já sai imediatamente após o boletim de ocorrência, muitos deles não foram ouvidos ainda. Então eles chegam até revoltados, por não terem sido escutados. E, no fim, saem daqui mais tranquilos, depois das explicações dadas, e isso favorece muito o progresso deles dentro do grupo e a aceitação do que eles vão ouvir lá nas temáticas que vão ser apresentadas”, relata a assistente social do MPMS.

Diva Maria ressaltou que o índice de reincidência é muito baixo, cerca de 3,5%.  Ou seja, mais de 96% dos participantes sem reincidir.

A palavra do participante

“A gente aprende bastante coisa, que é na diferença que começam as brigas”, exemplifica um ex-participante de grupos reflexivos, de 43 anos.

“Quando participei, disse que todo ser humano deveria fazer um curso desses”, resume.

Para o pleno êxito desses grupos, o MPMS atuou junto ao TJMS e às prefeituras Municipais de Chapadão do Sul e Paraíso das Águas e mais recentemente Porto Murtinho, de forma a capacitar a equipe multidisciplinar, levando adiante o trabalho de reparação de conduta e rompimento do ciclo de violência.

Parâmetros de resultado

Desde o início do projeto em Chapadão do Sul, 457 homens foram encaminhados ao projeto pelo Judiciário. Desses, 381 passaram pela formação nos grupos reflexivos, que foram estendidos também para a vizinha Paraíso das Águas, mais novo município sul-mato-grossense.

A maioria dos participantes possui escolaridade de nível fundamental incompleto e a faixa etária mais expressiva é de 30 a 39 anos, ou seja, homens em plena idade produtiva, que, por causa do envolvimento em crimes de violência de gênero, por vezes acabam sendo condenados à prisão, perdendo a capacidade laboral e faltando aos filhos e familiares.

Com a iniciativa, esses homens têm a oportunidade de modificar seu comportamento, reabilitando-se para o convívio social e as relações interpessoais.

Para as mulheres, o benefício que o Paralelas persegue é proporcionar um ambiente seguro nos relacionamentos, o que traz paz para todo o núcleo familiar e a comunidade. (Texto: Marta Ferreira de Jesus)

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